Blogue de um pretenso poeta, intelectual de cafeteria, reclamão de todas as horas e professor de Literatura por profissão (e, dizem, talento). Poemas e exercícios narrativos, crítica de cultura e maledicências ligeiras em tom farsesco. Tudo aqui é mentira.
6 de março de 2010
Gente feliz
Sexta-feira de manhã. Parei para tomar um café numa loja de uma grande rede de supermercados. Fui fazer o pedido, mas o caixa do setor ainda não abrira. "Moço, o senhor vai lá no caixa normal, paga e faz o pedido aqui, depois." Vi a fila dos idosos (sim, porque idoso é o ser mais madrugador que existe. Antes das galinhas acordarem, lá estão eles nos pontos de ônibus, nos supermercados e nos cafés.) no único caixa que funcionava, suspirei, já prevendo aonde essa história iria me levar, mas pensei que naquele dia poderia haver uma exceção. Com a demora de praxe, chegou minha vez, pedi um café e um pão de queijo. A atendente: "Fulano, cadê a lista de códigos do café?" O outro: "Não sei, aqui não está!" E a fila atrás de mim aumentando. E lá se foi a moça a procurar. Pergunta daqui, fala com a encarregada dali. Depois de um tempo, e após todo mundo que me segui ter desistido de pagar suas compras ali, diz a moça: "Olha, senhor, faça o pedido direito no café e depois você acerta lá mesmo, quando eles abrirem o caixa deles." Já havia desistido mesmo, mas segui adiante, só pra ver se a coisa chegava aonde eu imaginara. Fiz o pedido. O rapaz do café - depois de ter atendido uma senhora, evidentemente freguesa habitual - olhou pra mim e meio que bradou: "O caixa está fechado, o senhor tem que fazer o pedido nos caixas normais!" Respondi: "Acabei de vir de lá e me mandaram vir aqui. Eles perderam a ficha com os códigos." "Não, está com eles! Aqui não ficou!" Um diálogo non sense às 6 da manhã era tudo de que eu precisava para deixar meu dia feliz. Nem preciso dizer como terminou, preciso? Achei melhor tomar o bendito café no balcão da padaria mesmo. Apertado, desconfortável, sem nenhum sossego, mas pelo menos já sabendo que, naquele lugar, ninguém fica alardeando uma alegria que não tem como existir. Não aqui, não agora. Talvez nunca.