Estava eu voltando para casa, hoje, de metrô. Vagão cheio. No meio do trajeto, entra um camarada de camisa listrada (tenho um pé atrás com camisas listradas, já acho que é coisa de festa junina, o que também odeio), fone de ouvido pendurado no pescoço e falando alto, bem alto: "Não, meu querido, você vai ver, ela vai acabar se convencendo que está no caminho do pecado. Porque Jesus vai salvar ela. Sim, por Jesus!", e dava um murro na porta do vagão. Fez isso mais duas ou três vezes. Desligou o celular. Teclou outro número. E tornou a vociferar: "É, porque hoje está um dia lindo, um dia de Jesus. Um sol bonito, calor. Sim, porque eu acho que quando o sábado fica cinzento, é até coisa do...", e hesitou por um segundo. "...acho que deus (sim, para mim é minúsculo), nesses dias nublados, deus está de mau humor. Por Jesus!" E mais um murro na porta.
Pensei comigo: que espécie de divindade é essa que tem bom e mau humor, que faz dias cinzentos ou ensolarados conforme lhe dê na veneta de ter dormido de traseiro de fora da coberta ou não? Que deus é esse em que figuras assim acreditam? O que senti, ali, foi somente ódio e intolerância a quem fosse diferente do molde cristão; um fundamentalismo raivoso, de precisar andar com focinheira e rédea curta. Pior é constatar que ele não é o único, não será o último, mas que sua miopia é compartilhada entre milhões, incluindo gente poderosa e de prestígio, jogadores de futebol e políticos. É esse mundo que está chocando o ovo da serpente. E, sinceramente, não sei que quero estar vivo e fazer parte desse cenário que se desenha mais e mais no horizonte ensolarado de uma divindade tão excessivamente humana.