26 de setembro de 2008

Diálogos imponderáveis

Exemplos de conversas hipotéticas, mas plausíveis:

1
- Oi, lembra de mim? (Sem dizer o nome, nem de onde nos conhecemos.)
- Não.
- Ah, vai dizer que não lembra; faz um esforço!
- Se eu fizer um esforço nem vou dizer o que vai sair.
- ...

2
- Oi, lembra de mim?
- E como eu poderia esquecer? Você foi aquela pessoa que apareceu, disse que me amava etc. etc. e que, de repente, depois que eu desgracei toda minha vida por você - ou seja, depois que me apaixonei - resolveu sumir, alegando que estava confusa, que tinha uma outra pessoa, com quem você inclusive ia casar, e o resto a gente já sabe. E como você está?
- Não, estou melhor, fiz terapia, e coisa e tal, agora estou bem. Mas só estou te ligando pra pedir desculpas pelo que fiz, que não foi legal nem pra mim nem pra você, e que espero que a gente possa ser amigos daqui pra frente...
- Ah, bom. Então vamos tomar um café para...
- Não, nem pensar! Sou uma pessoa casada, não quero retomar aquilo tudo, impossível a gente se ver!
(Pensamento: trata-se de uma pessoa que leva a expressão "amizade virtual" à últimas conseqüências. Ou é maluca mesmo. Tendo à segunda hipótese.)

3
- Oi, você não me conhece, mas eu conheço uma pessoa que te conhece e que diz que gosta muito de você e que você é muito legal.
- Sei. E quem é essa pessoa? (Quem, neste mundo sem deus, pode achar isso de mim?)
- Ah, adivinha!
(Nada mais boçal que essa coisa estúpida de ficar fazendo joguinho de adivinhação. Pior que isso, só mesmo a onda do politicamente correto.)
- Olha, não tenho a menor idéia. Mas espera um pouco que vou consultar a lista telefônica. Vou ditar nome por nome e, quando o nome dessa pessoa aparecer, você grita "achou!!!!". Combinado?

Faltou, como deve ter percebido o(a) leitor(a) mais arguto(a), o comentário a respeito de encontros com ex-colegas de faculdade. Vou deixar vocês na expectativa mais uma vez, sinto muito.

22 de setembro de 2008

Mensagem na garrafa

Querida E.:
que bom que você veio aqui, leu alguma coisa e se deu ao trabalho de me mandar um e-mail comentando um de meus posts. Acho que você é a primeira pessoa, daquele pessoal da faculdade, que visitou meu blogue - a despeito de eu o manter já faz um certo tempo. Não vou negar que foi uma grata surpresa, eu que não gosto delas. E vindo de você, a quem muito admiro e respeito, foi particularmente especial.
Dito isso, reitero o que já dissera: muito do que este blogue traz é triste, menos por mim, e muito mais pelo mundo - que só faz nos deprimir mais e mais. Talvez a essência seja isso: não me permito o luxo da alegria - ainda que sejam as pequenas felicidades cotidianas, os instantes domésticos de plenitude - porque seria compactuar com a idéia de que nos espera alguma coisa que não seja a destruição, o aniquilamento, a decepção. Não sou assim; nunca fui. Acresce que, pela vias comuns do existir, tomamos contato com pessoas que nunca nos deixam esquecer a condição humana, essa capacidade infinita da crueldade, da vilania, da calhordice. Salvam-se, contudo, umas poucas, justamente aquelas que me fazem acreditar que ainda é possível adiar o lamaçal no qual chafurdaremos mais dia, menos dia. Você é uma dessas pessoas. E é por isso que escrevo esta carta, coloco-a numa garrafa e jogo-a neste mar virtual em que (ainda) conseguimos nos encontrar e nos falar. Talvez um dia você a leia. Talvez outros o façam. E eu, aqui, mesmo descrente da humanidade e de suas escolhas, pararei de teclar no computador e olharei pela janela, esperando que o dia que nasce ao menos não me traga as notícias cinzentas de sempre.

21 de setembro de 2008

Sobre rever pessoas

Os últimos dias, à parte a endoidecedora rotina de passar de um trabalho a outro, sem descanso, incluíram rever pessoas que eu não via há algum tempo e ensaiar uma tentativa de encontro entre ex-colegas de faculdade. No geral, gosto dessas ocasiões. Claro que só revemos pessoas de quem gostamos, a não ser em caos fortuitos como restaurantes e locais públicos, nos quais sempre existe a chance de esbarrar em gente desagradável. Assim sendo, e apesar de sempre premidos pelo tempo que não temos, são momentos em que você retorna a épocas menos infelizes, constata a passagem dos anos em você e nas pessoas, lembra situações cômicas ou nem tanto etc. Foi assim com a Renata, a Juliana e a Taty, questão de duas semanas atrás. Com a Fátima e a Kátia, no mesmo período. Com a Dani e a Janete, semana passada. Mais que mosaicos do passado, são e serão sempre presenças indeléveis, pelo que compartilhamos, pela amizade que fomos construindo - aos poucos e pacientemente. A elas, minha pequena homenagem neste blogue.
P.S.: valeria um post a respeito do acima citado encontro de ex-colegas. Mas deixo isso para uma próxima vez.

15 de setembro de 2008

Diretamente do inferno

A maturidade não traz sabedoria alguma. Também não proporciona epifanias, uma vida melhor, menos preocupações, essas coisas que a mídia faz questão de divulgar só para que tenhamos a ilusão de que, velhos, prestamos para alguma coisa que não seja azucrinar os novos. O que a maturidade traz, certamente, é uma saúde pior, a certeza de que seu corpo já não agüenta os trancos que o existir nos proporciona, o desalento, nenhum encanto.

6 de setembro de 2008

Hahaha

Imaginem a cena: lotação subindo ruas íngremes na zona leste. O motorista, ao que parece, tem vocação para assassino, daqueles psicopatas. Acelera, freia com força, passa por lombadas sem diminuir, faz curvas sem tirar o pé do acelerador. E a desgraça ali, lotada, um calor de cozinhar até galo velho, pessoas com o desodorante vencido. Para completar, o som berrando nos alto-falantes: "rebola, rebola, rebola... é assim que você gosta? rebola, rebola..." ou coisa do gênero. Não há mesmo nenhuma esperança pra essa gente. Eu disse gente? Esqueçam.

4 de setembro de 2008

Cultura isenta? Nem pensar!

E depois, quando eu digo que o mundo é composto de gente que f... e gente que é f... - e que a maior parte, incluindo eu mesmo, está no segundo grupo, ainda me dizem que sou pessimista. Acabei de ter mais uma prova, hoje mesmo, de que nem chego perto da verdade, quando o assunto é o mundo calhorda.

3 de setembro de 2008

Muito engraçado

O presidente, em mais uma de suas aparições públicas, desta vez fazendo demagogia com o petróleo que ninguém sabe se pode realmente ser extraído, soltou o verbo e pôs na avenida seu repertório infinito de gracinhas. A platéia que lá estava, toda ela composta de acólitos, deu risada. Não achei graça alguma. Na verdade até eu, com cólica renal, sou capaz de tiradas melhores e, diga-se, menos vulgares. Mas a pérola ficou para o trecho em que o grande líder iluminado disse que, do jeito que a Petrobras "vai fundo", daqui a pouco a broca vai puxar um "japonesinho" e aí teremos um problema internacional. Juro, estou com dor de estômago de tanto rir. Valem lembrar que, há pouco, o mesmo sujeito participava das cerimônias em comemoração ao centenário da imigração... japonesa. Diplomatas ririam, bajuladores rirão, a massa rirá. Mas, é claro, ninguém admitirá que discriminamos pessoas, tudo não passou de uma brincadeira, eu é que não tenho bom humor, sou um representante da direita etc. etc. Enquanto isso, a caravana passa...

1 de setembro de 2008

Para guardar no caderninho preto

Pesquisa recentemente divulgada mostra que parcela considerável do público de cinema prefere assistir a filmes dublados. Da pespectiva de quem gosta de ver tudo cor-de-rosa, nada mais animador, já que, assim, estamos nos igualando aos norte-americanos, que também preferem assistir aos filmes estrangeiros dublados no idioma deles. Estaríamos nos tornando menos colonizados, livrando-nos, desse modo, do jugo do imperialismo ianque? Nem pensar, já que 90% do que assistimos nos cinemas é produto de lá mesmo. O que a pesquisa mostra, de maneira quase cristalina, é que continuamos analfabetos, cada vez mais, e que não há estatística governamental que consiga mascarar a farsa que é o ensino neste país. Preferir a dublagem não é afirmar o idioma local, a marca de nossa nacionalidade capenga, mas simplesmente é uma forma de disfarçar a incapacidade de ler as legendas e acompanhar o filme ao mesmo tempo. Um problema que pode ser, também, coisa de limítrofe. Neste caso, concordo: estamos bem próximos aos norte-americanos.