23 de junho de 2012

Após um longo e tenebroso verão...

Conto novo na parada. Duas pessoas são "culpadas" por isso. Não vou dizer o nome de nenhuma das duas, até porque ninguém tem nada com isso. Não sei se será a versão final, mas muito provavelmente não. Por ora, está mais para uma "aversão inicial". “Do outro lado” Começa devagar, como em duelo, esse dueto dúbio sob o sol invernal, nem por isso menos cáustico, começa que ela está do outro lado da avenida de dupla pista, vejo quando ela me pisca, aqueles olhos feitos amoras, à distância amara, começa devagar em meio a carros motocicletas bicicletas ônibus cortando nossa visão, vislumbrando-me versões pastel de suas coloridas vestes, cândida vestal, em voltas que vão e vêm. Assim devagar, enquanto sopra um vento sob o sol invernal que ao leve levanta o que ela veste, um pouco, revelando suaves coxas que lápida recobre com rubor nas faces, aguardando que as luzes mudem de fase, o rubro diante nós, sem intenção de me deixar passar, e ela sorri quase me convidando a ir, em suicida caminhada, ao encontro do que me promete aquele riso franco, encimado pelo sabor de amora sob o sol de inverno, o vestido curto de cores cítricas. Assim, lentos, os segundos escorrem em décadas, dissolvendo tempo, tarde, os cabelos dela desafiando a gravidade, as luzes que esboçam sinalizar um lapso, e meu corpo se retesa, vejo que o dela também, antes de eu lhe acenar a dizer que aguardasse e se guardasse, sem dubiedade, sem duvidar de que fizesse a travessia daquele caudal escuro onde nadávamos nossas dúvidas, as luzes mudam, e eu, mudo, cruzo a dupla via, embora cuidoso, vejo que ela cresce toda em meu olhar, primeiro em pernas, depois o corpo, enfim o rosto onde colho as amoras ali plantadas, sob o sol de inversos, o amor que ali se plantou, o riso aberto, como entreaberta a boca, os lábios em mim, eu inteiro neles, ambos inteiros em nós e laços, enlaçados em braços, quase tornados em um, unidos, agora não mais devagar, sôfregos, ainda assim suspensos, num querendo que ali se fazia, fazendo, sendo, sob o sol de inverno sem nenhum sentido senão mãos, bocas, lábios, peles, cabelos.