25 de dezembro de 2009

É verdade

É verdade que eu podia morar nas áreas que alagaram; é verdade que eu podia passar fome e sede e frio debaixo de um viaduto qualquer; é verdade que eu podia estar há dias sem banho, vestindo roupas rotas e sujas e fétidas; é verdade que eu podia ganhar a vida expondo minhas chagas e aleijões numa calçada do centro da cidade; é verdade que eu podia ter sido órfão e passado necessidades e privações de todos os tipos; é verdade que eu podia ser beneficiário de uma bolsa-qualquer e, assim, ser eleitor do farsante do Lula ou de seus candidatos; é verdade que eu podia não ter estudado em universidade pública e, no máximo, ter me formado numa dessas uniqualquer coisa. Tudo podia ser verdade, mas não é. Nem por isso me sinto desprovido do direito de ser infeliz, de ter minhas tristezas, minhas angústias e minhas frustrações miúdas de classe mé(r)dia. Como se apenas os pobres, negros e fudidos pudessem reclamar do que a vida não lhes deu. Como se a tristeza fosse propriedade privada dos que de quase tudo foram privados. Essa demagogiazinha, ela sim, me cansa profundamente.
Um bom 2010, se ainda for possível.

15 de dezembro de 2009

Rápida outra vez

O que me espanta na dita intelectualidade brasileira é sua capacidade quase insana de se deixar levar por ídolos de barro, ou melhor, de graxa. Isso, a maioria. Os demais se locupletam.

5 de dezembro de 2009

Desastres

Para não perder o costume, desastres cometidos a granel. Falta-me o senso da medida e do ridículo. Verdade é que a idade pesa mais que saco de arroz de cinco quilos depois de quinze andares subindo pelas escadas. Mas eu sempre tive comigo essa condição exagerada, hiperbólica e apaixonada. Doença de que tento me curar com doses cavalares de observações amargas, tiradas irônicas, olhares cínicos e ceticismo sob as unhas. A régua da descrença se faz com toneladas de uma fé no que não pode ser. Nem todo mundo pode ter aquilo que deseja. Na verdade, quase ninguém. E o que nos move senão essa ilusão no porvir? Estou vivo, decerto. Mas há tempos que isso não me serve de consolo. Face a isso, pouco resta, senão o sono. E que ele não demore a vir e a me levar.

1 de dezembro de 2009

Adendo

Que tempos esses os nossos nos quais temos de explicar TUDO o que dizemos... O próximo passo, como dizem por aí, é começar a desenhar, já que ninguém é capaz de fazer uma abstraçãozinha que seja.
Você tem dinheiro para comprar um celular. Um bom celular. Desses que tiram foto, tocam MP3, filmam, levam o cachorro pra passear etc. Mas o que você queria mesmo era aquele outro, que faz as mesmas coisas mas manda e recebe e-mails, permite navegação na internet, lava, passa e cozinha. E custa três vezes mais. O que você, pessoa sensata, faz? Gasta o que não tem para ter o aparelho mais moderno só para descobrir que não tem a menor condição de mantê-lo. O mesmo vale para outras situações assemelhadas: carro, cargo político, lugar para morar, emprego e por aí afora.
Isso tudo para deixar claro que este que aqui escreve mente (no sentido literário) o tempo todo, e que nada aqu deve ser levado de forma tão explícita quanto algumas pessoas fizeram.
Aguardem cenas do próximo capítulo.