6 de outubro de 2006

Adendo de última hora

Pessoas desmedidas são, como nos ensina a teoria literária, sujeitos afins com a raiz trágica das coisas. O desmesurado, o sem-noção-do-decoro, o herói trágico. Infelizmente, nos tempos em que vivemos, essa categoria foi rebaixada à figura do canalha. O canalha é aquele que imagina, em seus delírios, estar no centro da existência universal. O canalha é o que se agarra às sinecuras como um náufrago, ao mesmo tempo que as desdenha. Mas diz estar "defendendo sua honra". O canalha, para fazer valer sua opinião, exerce coerção sobre seus inferiores. O canalha ameaça, grita, esperneia. O canalha, desrespeitador das leis, faz uso delas quando lhe interessa, brande a tábua dos Mandamentos quando algo sai fora de seu figurino autoritário. O canalha acha que sempre vai se safar. Mas, ainda que na condição de rebaixado, a tragicidade de sua trajetória só pode mesmo redundar em sua destruição, no despedaçamento, na dilaceração. Ao contrário, porém, do herói trágico, o fim do canalha provoca, no máximo, um suspiro de alívio em suas vítimas, e o lamento hipócrita de seus seguidores.